Em entrevista ao programa Fantástico, da Rede Globo, o ex-técnico da Agência Nacional de Segurança (NSA) dos Estados Unidos, Edward Snowden, revelou mais uma vez que viria ao Brasil se o país lhe oferecesse asilo. "Se o Brasil me oferecer asilo, eu ficarei feliz em aceitar. Eu adoraria morar no Brasil", disse o norte-americano.
Snowden ainda disse que chegou a enviar um pedido de asilo ao governo brasileiro, mas que não obteve resposta – na época, o governo disse que não recebeu pedido algum do ex-técnico. "Quando eu estava no aeroporto [em Sheremetyevo, na Rússia], mandei um pedido a vários países. O Brasil foi um deles. Foi um pedido formal", afirmou. Ele também comentou que não sabia que o governo não havia recebido seu pedido. "Talvez seja algum procedimento que eles achem que não foi seguido".
Perguntado se ainda existem mais documentos sobre a espionagem norte-americana no Brasil, Snowden confirmou que sim. "Com certeza, tem mais documentos que vão mostrar a brasileiros e ao mundo o que os Estados Unidos estão fazendo dentro do Brasil e também da Inglaterra e outros países também".
Vida na Rússia
Considerado o homem mais procurado do mundo, esta foi a primeira entrevista de Snowden para uma emissora de TV brasileira. Para entrevistá-lo, a repórter do Fantástico, Sônia Bridi, assim como jornalistas de emissoras de vários países, recebeu apenas o nome do hotel onde deveria se hospedar e aguardou a chegada de Snowden no próprio quarto onde ela estava hospedada. Ele disse que evitou dar entrevistas durante o último ano porque não queria tirar a atenção dos documentos divulgados, mas que agora, com quase todas as revelações publicadas, se sente seguro para discutir seus sentimentos.
Edward Snowden vive há dez meses asilado em Moscou, capital da Rússia, em um lugar que nem seus amigos mais próximos sabem. De acordo com o norte-americano, a Rússia não é um país perfeito, pois monitoram a internet e censuram fortemente a imprensa, mas que o dia a dia no país é melhor do que estar na prisão. Antes de receber asilo, o jovem teve de passar 40 dias na área de trânsito do aeroporto de Moscou porque o passaporte dele foi cancelado, impedindo-o de viajar para outros países.
"Eu nunca escolhi vir para a Rússia. Eu estava a caminho da América do Sul [para o Equador]. Mas os Estados Unidos cancelaram meu passaporte e eu não pude mais viajar. Fizeram de propósito para poder dizer: ‘Ele é espião russo’", disse. "Foi muito tenso [ficar na área de trânsito do aeroporto]. Você não sabe o que vai acontecer naquele dia. O que vai acontecer enquanto você dorme. Se alguém vai bater na porta. Se alguém vai derrubar a porta".
Snowden diz ter certeza de que os russos possuem algum tipo de programa de vigilância, mas que ele não percebe nada. Ele ainda diz que leva uma vida "surpreendentemente aberta" e até é reconhecido pelas pessoas quando vai a lojas de computadores. No entanto, se negou a comentar se sai às ruas disfarçado ou como Edward Snowden. "Melhor eu não responder essa", afirma.
Documentos
Boa parte dos arquivos que comprovam o gigantesco esquema de monitoramento online da NSA já foram divulgados, mas Snowden afirma que ainda existe milhares de documentos com os maiores segredos da espionagem norte-americana. Acredita-se que ele tenha se apropriado de 1,7 milhão de documentos secretos guardados em computadores da agência. Os arquivos revelaram programas executados pela NSA que reuniam informações sobre e-mails, telefonemas e o uso da internet por milhões de pessoas em todo o mundo, até mesmo de diplomatas como a chanceler alemã Angela Merkel e a presidente Dilma Rousseff.
Edward Snowden em entrevista ao programa Fantástico (Foto: Reprodução/Rede Globo)
Além de líderes globais, a NSA possui armazenado o conteúdo das comunicações de países inteiros, como México e Bahamas. Segundo Snowden, como em uma máquina do tempo de espionagem, a agência pode voltar ao passado e recuperar tudo o que foi dito ou escrito por qualquer usuário de internet no mundo. "É como se os Estados Unidos tivessem contratado detetives particulares para seguir todos nós", ele destaca.
A decisão de divulgar as ações da NSA veio depois de Snowden acompanhar um depoimento de James Clapper, chefe da espionagem do país, no Congresso. "Ele levantou a mão, jurou dizer a verdade. Perguntaram para ele: ‘Os Estados Unidos monitoram informações de milhões de americanos?’ E ele disse: ‘Não’. E eu sabia que era mentira. Os deputados da comissão também sabiam que era mentira. E ninguém disse nada", explica.
A partir daí, Snowden iniciou a coleta de milhares de documentos sobre a vigilância da NSA enquanto trabalhava como especialista em tecnologia e cibersegurança no prédio da agência no Havaí. No fim de 2012, entrou em contato com o jornalista Glenn Greenwald, que trabalhava no jornal inglês The Guardian, para que Gleen instalasse um programa de criptografia que protege o sigilo na internet para eles se comunicarem. Em junho de 2013, Snowden se encontrou com Glenn e a documentarista Laura Poitras, em Hong Kong, e entregou aos dois os arquivos que roubou da agência.
Julgamento
Edward Snowden disse na entrevista que voltaria aos Estados Unidos se pudesse enfrentar um julgamento justo, mas sabe que isso não vai acontecer. O ex-técnico é acusado de traição pelo ato de espionagem, uma lei feita em tempos de guerra que prevê julgamento sem defesa pública. Ele também é acusado pelo roubo de propriedade do governo, comunicação não autorizada de informações de defesa nacional e comunicação internacional de inteligência sigilosa por uma pessoa não autorizada.
Há ainda a acusação de que Snowden atrapalhou a relação norte-americana com países amigos, vazando documentos com revelações que comprovam que os EUA e seus aliados (Inglaterra, Canadá, Austrália e Nova Zelândia) grampearam os telefones e monitoraram os e-mails de empresas e líderes globais. Entre eles a presidente Dilma e de seus assessores mais próximos, além da Petrobras e o Ministério das Minas e Energia.
Alguns congressistas norte-americanos consideram Snowden um traidor devido suas revelações sobre a NSA. O governo também afirmou que a luta contra o terrorismo ficou mais difícil por causa dos vazamentos. "Você não pode ser traidor a menos que a sua lealdade tenha sido transferida para um inimigo do Estado. E a minha lealdade nunca mudou. Mesmo hoje, eu continuo trabalhando para o governo americano. Não quero derrubar o governo e nem destruir a NSA. Quero que sejam melhores", disse o ex-agente.
Snowden também repetiu seu discurso de que não se arrepende do que fez porque acreditava ser necessário tornar público o que a NSA estava fazendo em prol da liberdade. "Não é sobre privacidade. É liberdade. O equilíbrio entre os direitos individuais e o direito que o governo tem de coletar informações. Se vigiarmos cada homem, mulher e criança, da hora em que nascem até a hora que morrerem, podemos dizer que eles são livres? Isso é muito perigoso porque mudamos nosso comportamento se sabemos que estamos sendo vigiados. É uma ameaça à democracia", afirma.
Fonte: CanalTech
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